Limpeza Profissional & Gestão de Resíduos: os impactos sobre o meio ambiente em tempos de pandemia

O Brasil descarta cerca de 80 milhões de toneladas de resíduos por ano. Devido à pandemia, a previsão é de um aumento na quantidade nos domicílios (15-25%) e no setor hospitalar (10 a 20 vezes) – dados do estudo da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe) divulgado em maio.

Com esta realidade, como fazer a gestão correta de resíduos em tempos de Covid? Quais os impactos gerados no meio ambiente? Como capacitar as equipes de Limpeza para o manejo correto? Quais as responsabilidades legais?

Para responder essas e outras perguntas, a Abralimp realizou o webinar “Limpeza Profissional & Gestão de Resíduos na Pandemia”. Mediado pela jornalista Fernanda Nogas, da revista Higiplus, o debate teve a participação do presidente da Regional SP da ABES (Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental), Ricardo Crepaldi; do diretor-presidente da Cooperativa Yougreen, Roger Koeppl; e do diretor de Sustentabilidade e Certificação da Abralimp, Guilherme Salla. Confira!

Vantagens do manejo correto

Resíduos não são iguais: cada um tem seu manejo, transporte e destinação específicos. A gestão de resíduos para os Facilities sempre foi um desafio e, na pandemia, há um elemento extra: os EPIs (máscaras e luvas, muitas vezes descartáveis) que passaram a ser exigidos nos ambientes de trabalho.

“Nos locais onde já acontece a coleta seletiva, se não houver treinamento adequado à equipe, pode acabar ocorrendo o descarte incorreto e a contaminação do material separado para a reciclagem”, explicou o diretor de Sustentabilidade da Abralimp, Guilherme Salla. “É preciso que a empresa tenha um plano de gestão de resíduos bem definido e que haja orientação clara em relação ao descarte de EPIs, sempre em coletores ou sacos separados, para não contaminar o que já passou pela coleta seletiva”.

Outro ponto crucial, como mencionado acima, é o volume do descarte no Brasil:  cerca de 80 milhões de toneladas por ano. E se a boa notícia é que grande parte disso poderia gerar receita, o desafio é convencer o mercado e o próprio tomador de serviços.

“Em muitas empresas, as regras governamentais para a gestão de resíduos ainda são vistas como novidade ou como ‘mais uma obrigação a administrar’”, disse Roger Koeppl, da Cooperativa Yougreen. “Nossa abordagem é mostrar de forma muita concreta o alcance dos três pilares da sustentabilidade: não só o social e o ambiental, mas também o econômico. Fazendo a implantação correta e deixando de mandar seu lixo para o aterro sanitário, a empresa pode chegar a uma economia de até 20% nos custos”.

Além da parte financeira, quando a empresa deixa de lado o processo de aterramento, possibilita que o material volte à cadeia produtiva e se transforme em renda para outros trabalhadores, promovendo uma grande economia ambiental em termos de emissão de carbono e consumo de matéria-prima. E se ainda não for argumento suficiente, o próprio Ministério do Meio Ambiente já fez as contas: com o atual desperdício por não reaproveitamento de resíduos, o país deixa de ganhar R$ 8 bilhões por ano.

A corresponsabilidade do facility

Outro cuidado abordado durante o webinar foi com as questões legais. “O facility é responsável por toda a cadeia de prestadores de serviços com a qual está envolvido”, destacou Ricardo Crepaldi, da ABES-SP. “Aí mora o ponto crítico: a seleção desses prestadores ou a garantia de que possuem a qualificação necessária para cumprir com as normas legais da gestão de resíduos. Muitas vezes a qualificação está só no papel e isso é grave porque, além do impacto ambiental, traz problemas judiciais, de multas e para a imagem da empresa”.

Ricardo destacou a questão da “corresponsabilidade” nos casos em que o fornecedor não tem a expertise necessária ou mesmo quando age de má fé (fazendo descarte irregular, por exemplo).  “Quando um resíduo é gerado por uma empresa, ela é a responsável até sua disposição final, não importando quantos prestadores ou subcontratados estejam envolvidos no processo. Individualmente, essa responsabilidade pelo cumprimento da lei recai sobre o facility, não apenas enquanto preposto da empresa, mas como pessoa física. Daí a importância de ver a qualidade do prestador e não simplesmente contratar por preço. É preciso termos mais gestores com alto nível de compliance em sustentabilidade, aptos a ‘cumprir com o que manda a lei e fazer o certo’”, disse Ricardo.

Gestão de resíduos e o mercado de limpeza

Embora a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) tenha completado 10 anos no início de agosto, a evolução das ações sustentáveis no Brasil – e, também, no mercado de Limpeza Profissional – ainda são tímidas. “Gostaríamos que isso já estivesse ‘nas veias’ de todos em nossa cadeia”, disse Guilherme. “Mas ainda é normal nos depararmos com clientes ou situações em que o profissional sequer tem conhecimento da existência da PNRS, o que nos faz muitas vezes assumir um papel consultivo”. Guilherme ressaltou que a missão da Abralimp e das demais associações correlatas é trazer esse assunto a público e difundir mais formas de operacionalizar a gestão de recicláveis e outras ações de sustentabilidade.

“Vemos empresas muito preocupadas com a questão e que desejam até ir além do que a legislação prevê, mas ainda são poucas. Nossa vontade de mudar esse cenário foi o que impulsionou a criação da diretoria de Sustentabilidade dentro da Abralimp. A entidade sempre teve essa preocupação, mas entendemos que nesse novo momento que vivemos é fundamental ter algo mais formal e direcionado para orientar nosso mercado”.

Roger completou, ressaltando como fator imprescindível a capacitação e o engajamento do trabalhador da Limpeza Profissional. “A equipe de limpeza é a que ‘fecha’ o saco de resíduos e a da cooperativa é a que ‘abre’. A prestadora é o elo imediatamente anterior à cooperativa. Neste aspecto, é de suma importância envolver o agente de limpeza e mostrar o que acontece depois que ele fecha o saco. Buscamos mostrar que a pessoa que irá abri-lo na cooperativa é alguém como ele, inclusive com um perfil socioeconômico parecido, que também sente cheiros, também pode se machucar caso o resíduo não seja bem acondicionado, de forma a humanizar e criar empatia nesta relação com a gestão dos resíduos”.

O fato é que estamos, todos, em um momento de reeducação enquanto sociedade. Um momento de aprendizado para lidarmos com o novo, para nos adaptarmos e talvez seja essa a grande oportunidade para direcionarmos de vez nossa atenção aos resíduos, seu potencial e seus impactos no meio ambiente.

Além do conteúdo discutido neste webinar, a Abralimp preparou o documento abaixo com respostas às principais dúvidas do público:

  1. Para Ricardo – Quais os principais itens que o prestador de serviços deve ter para ser um “bom prestador de serviços? ” – Wagner Miranda.

Além, é claro, do compliance direto e indireto, ele deve ser especializado no que está propondo a executar; estar sempre buscando conhecimento e melhoria continua para seus processos; deve ter pessoas devidamente habilitadas nas atividades que faz; ser muito criterioso e responsável no caso de quarteirizacao de serviços; vestir sempre a camisa da empresa tomadora do seu serviço.

  1. Para todos – Existe algum tipo de fiscalização ambiental, de uma empresa governamental, no acompanhamento desse trabalho de coleta de resíduos? – Rubens Portella Júnior.

Sim, e em vários níveis (municipal, estadual e federal), porem praticamente todos trabalham por denúncia. Como falamos no evento as fiscalizações rotineiras somente ocorrem dentro de atividades industriais

  1. Para todos – Quais os critérios adotados para a avaliação desse trabalho de coleta? – Rubens Portella Júnior.

Além dos naturais de segurança pessoal e manuseio adequado, o treinamento das pessoas envolvidas; os respectivos índices de qualidade/quantidade do material reciclado; a diminuição constante do volume para aterro; entrega de relatórios/mtr na qualidade e prazo necessário, entre outros.

  1. Para todos – Vocês acreditam que a tríade da sustentabilidade – ambiental, social e econômica – encontra-se incompleta na atualidade? Uma vez que os outros vieses devem se ligar ao conceito diante das novas realidades? Um exemplo para complementar seria a boa governança organizacional? – Nívia.

Não falo que ela está incompleta acho o conceito transcende a questão do tempo e está mais viva e atual que nunca. Pois para mim esse e outros pontos devem estar dentro da cultura da empresa nos dias de hoje (como o compliance, bpf, qualidade, governança etc). Esses pontos não se discutem, eles são mandatórios para a empresa permanecer no nosso competitivo mercado.

Entendo que qualquer implementação no âmbito da sustentabilidade, necessariamente precisa ter o engajamento da governança organizacional, ou pelo menos a organização tem que ter uma cultura voltada a isso. De qualquer forma quando falamos da tríade, estamos falando do ponta pé inicial de qualquer projeto.

  1. Para todos – Há uma diversidade enorme de perfis, situações e conjunturas de contratantes que, hoje, mais do que nunca, estão focados em redução de custos. Cotando “preço”. Pouquíssimos tem preocupação com gestão de resíduos. Considerando que há necessidade de instrução e treinamento de pessoal, uso de espaço, etc, que envolvem “mais” custos, como as Prestadoras de Serviços de Limpeza profissional podem “incentivar” clientes a terem preocupação com o meio ambiente? Como mudar a visão de “custo” para entendimento de que é um investimento (em saúde, meio ambiente, etc.)? Luiz Mattos.

Na verdade, acho que as empresas de limpeza erram em não mostrar o seu valor agregado dentro desse importante processo e seu papel fundamental na conscientização dos usuários, devem mostrar que vão muito além da limpeza. Claro que não são todas as empresas de limpeza que tem essa condição, pois falamos no webinar sobre a necessidade clara de melhor qualificação do setor. Sempre existirão empresas que compram somente pelo preço e são essas mesmas que acham que a equipe de limpeza deve ser invisível, mas acredite esse tipo de empresa contratante estão diminuindo dia a dia.

Entendo que este conhecimento não envolva grandes custos, pois por exemplo, para um cliente que não possui absolutamente nada, uma simples separação de resíduos já é um grande avanço para todo o meio ambiente e mercado, e isso depende apenas de alguma liderança puxar a fila e mostrar que dá para executar. Por isso acredito muito na capacitação, treinamento e muito diálogo com o contratante. Em situações de maior complexidade é sempre importante envolver um parceiro com expertise que nas maiorias dos casos consegue trazer uma redução de custos, comparando com o modelo mais praticado normalmente.

  1. Para todos – Apesar da existência da responsabilidade compartilhada dita na PNRS, o gerador acaba tendo maior responsabilidade. Em junho, saiu a portaria 280/2020 que institui o MTR . Vocês acham que isso assegurará o caminho correto do resíduo até seu destino? – Rafaela Lima​.

Só a obrigação legal não vai fazer melhorar por si só a situação. O bom gestor é aquele que avalia e monitora diariamente toda a cadeia do manuseio interno, do transporte e da disposição. Infelizmente não temos como nos dias atuais “relaxar” nesse aspecto. Devemos cada vez mais procurar melhores ferramentas e melhores parceiros para nosso trabalho diário.

Acredito que isso venha para reforçar todo o processo, sabemos que na prática ainda estamos muito aquém do que deveríamos executar. Vejo com bons olhos pois é mais uma ferramenta para assegurar o transporte de resíduos.

  1. Para todos – como fazemos com os lixos eletrônicos que está cada vez maior? – Luciene M Freire.

Existe solução para isso. Sim claro já foi pior, mas hoje temos muitas empresas trabalhando com o correta separação e reciclagem desse tipo de resíduo. Fora os fabricantes também estão focados com na logística reversa dos seus produtos (com ou sem acordo setorial).

Hoje existem empresas especializadas em logística reversa de lixo eletrônico. Muitas acabam não cobrando pelo recolhimento do material pois possuem já uma cadeia que é compradora deste material, muitos componentes eletrônicos conseguem ser remanufaturados para outras finalidades.

Assista ao webinar na íntegra, clicando aqui!

Fonte: ABRALIMP – Associação Brasileira do Mercado de Limpeza Profissional.

Foto: Divulgação.